sábado, 14 de janeiro de 2012

O Ferro


- Mãe, por que a tia Fátima não gosta mais do tio Roberto?
- Bom, filho. Isso é complicado. Não é que eles não se gostem. Mas, conforme o tempo passa, algumas coisas acontecem num relacionamento, e o casal prefere se separar para que ambos não se machuquem.
- O tempo passa?
- Passa, filho, para todos nós.
- Que nem o ferro de passar roupa?
- Hum… Bom, digamos que sim. O tempo também desamarrota algumas coisas.
- No caso da tia Fátima, desamarrotou o sentimento?
- É mais ou menos isso.
- Mas tem roupa que não amarrota. O amor amarrota? O amor ama a rota… Rotina! O amor amarrota e cai na rotina, mãe?
- Vamos com calma com o jogo de palavras, Victor, o dia acabou de começar!
- E se encostar, o tempo queima que nem o ferro?
- Não, filho. A concepção de tempo é muito complexa para eu te explicar.
- Tá bom, mas se o tempo passou e desamarrotou o sentimento, então ele ficou lisinho, igual acontece com as roupas, né?
- Acho que sim, Victor. Com o tempo esquecemos muitos amarrotados também.
- Mas, se está liso, está pronto para usar, né mãe?
- Ou para guardar. Não é assim com as roupas?
- É. Mas eu guardo no guarda-roupas, que é lugar de roupas. Já que a tia Fátima não queria usar, então por que ela não guardou o amor lisinho no coração, que é lugar de sentimento?
- Victor, talvez ela tenha esquecido desse sentimento.
- É como jogar uma roupa fora?
- Mais ou menos, filho. Talvez ela tenha jogado fora por que achou muito amarrotado.
- Mas, o tempo não passou?
- Passou, Victor. Mas o tempo é um ferro velho.
- Mas, vocês vivem dizendo que o tempo passa rápido, então ele só pode ser um ferro a vapor. E ferro a vapor não deixa nenhum amarrotado pra trás!
- Victor, por que não falamos de coisa que interessa, como o seu dever de casa?
- Tá amarrotado, mãe.
- E por qual motivo você não deu um jeito de desamarrotar ainda?
- É isso mesmo que eu to fazendo, ué. O tempo passa.  

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